Entrevista

«A totalidade do negócio, na próxima década, virá da IoT»

Hoje, metade do negócio da Schneider Electric já vem da divisão de Internet of Things. Cyril Perducat, vice-presidente executivo, diz mesmo que, daqui a dez anos, todo o negócio será IoT. Porque tudo estará ligado à rede. 

O conceito de IoT não é propriamente novo para Schneider Electric, certo? 

Sim, é correcto dizê-lo. O nome esse, é novo, mas se sumarizarmos o conceito IoT, entendido como o acto de conectar coisas, não é novidade, já o fazemos há vinte anos. 

É um facto que a indústria das TI é “perita” em fazer isso. Em pegar em algo que já existe, dar-lhe nova roupagem e nome e vender de forma distinta. Estou a cometer alguma imprecisão? 

Não. Eu acrescentaria que as TI e os consultores são peritos em fazê-lo. Em criarem “revoluções” para melhor vender. 

O que aconteceu, então, nos últimos anos e que veio potenciar esta “revolução”? 

O que aconteceu é que a paisagem das coisas conectadas evoluiu em muitos mercados porque a própria tecnologia também evoluiu. O mercado amadureceu e as oportunidades de negócios são agora maiores. A cloud, por exemplo, da qual absolutamente toda a gente fala, o que aportou à IoT foi a oportunidade de ter poder computacional a preços muitos acessíveis. O cliente não tem, agora, que fazer grandes investimentos on-premise.  

É verdade que ainda se fazem desenvolvimento on-premise, sobretudo no que diz respeito a serviços críticos, mas que são complementados com a cloud. Que nos permite processar mais informação e beneficiar da elasticidade das necessidades de computação. Depois, temos esta coisa fascinante chamada smartphone que ajudou a indústria electrónica a reajustar-se em termos de preço. Os chips, as câmaras, os sensores que hoje temos nos nossos telemóveis e que são vendidos em volume tão grande fizeram com que os preços diminuíssem. Tudo o que é computação embutida é actualmente muito mais barata. No caso da Schneider Electric, isso fez com que introduzíssemos muito mais inteligência nos nossos produtos. 

Os produtos comunicam mais? 

Os produtos ganharam a capacidade de comunicar. Não só recebem informação, como a distribuem, conseguem partilhar informação com o resto da infra-estrutura. É por isso que precisamos da cloud e do seu poder de computação, porque cada vez mais temos informação para processar. Há outra evolução curiosa, esta mais ao nível da matemática e ciência dos dados, da analítica e Inteligência Artificial, que vai ser fundamental na IoT. Os clientes não querem mais dados. Querem, isso sim, tomar melhores decisões. E entre os dados e as decisões, há o passo da informação. Ou seja, há que transformar os dados em informação válida, há que os processar, que os agregar, que lhes atribuir um contexto. 

Pode dar-nos um exemplo? 

Imagine que quer regular a temperatura dentro de um edifício. Se quisermos optimizar este processo, temos de saber a temperatura exterior, temos de entender a humidade… daí sairá um algoritmo que optimizará a termodinâmica do edifício, tudo sem afectar o conforto e melhorando o consumo energético. A Inteligência Artificial e a analítica permite-nos fazer essa transição entre dados e informação.  

No seu blogue defende que a Inteligência Artificial será a resposta para o que apelidou de «apocalipse dos dados»… 

… que não é mais do que um efeito secundário da IoT. Uma refinaria pode ter mais de mil equipamentos conectados. Já um edifício médio de escritórios, de dez andares, pode ter entre os dez e os quinze mil sensores. Imagine tudo isto a enviar dados, por exemplo, para um smartphone. Seria impossível. Já temos, mesmo assim, demasiada informação nos nossos telemóveis. Demasiados alarmes, mensagens, notícias…  a AI vai permitir canalizar apenas a informação mais relevante e para a pessoa indicada. Se eu for o gestor das instalações, é claro que vou querer receber todos os alarmes críticos. Mas lembre-se de que, primeiro, há que definir o que é crítico… 

Em todo este ecossistema, qual o papel da Schneider Electric? 

Tipicamente, os provedores de TI fornecem a infra-estrutura, certo? Não têm propriamente que conhecer as necessidades dos gestores das instalações, por exemplo. A Schneider Electric introduz Tecnologias da Informação nas suas soluções, mas somos basicamente os que falamos com os gestores de fábrica, com os gestores dos hospitais, com quem está mais perto da operação. Se falamos em TI ou IoT, a Schneider Electric está mais na IoT. 

A cloud veio democratizar o acesso à tecnologia, até pelo efeito de baixa de preço, que mencionou antes? 

Mas a baixa do preço não é o mais importante, repare. O acesso é bem mais prioritário. Na IoT, por exemplo, toda a gente pensa em grandes companhias. Mas essas têm um CIO, um departamento de TI. As PME, não. Logo, dando acesso a soluções “as a service” vai potenciar os negócios dessas pequenas e médias estruturas. 

As PME têm a “coragem” de pedir à Schneider Electric ajuda nesse departamento? Não está a vossa marca demasiado “colada” às grandes estruturas empresariais? 

Não. Há concorrentes que estão mais dedicados às grandes empresas do que nós. Somos conhecidos, isso sim, por termos um imenso e rico ecossistema, composto por 500 mil empresas espalhadas por todo o mundo. São muitos parceiros, um número que nos garante proximidade e intimidade com o cliente. Da mesma forma que desenvolvemos soluções digitais, queremos que os nossos parceiros as desenvolvam, porque são eles que vão estar com o cliente. Não posso especificar em Portugal, mas globalmente, cerca de 80% do nosso negócio é feito através de parceiros. Como percebe, são muito importantes para nós. 

Que tipo de desafios enfrenta a IoT? 

A tecnologia não é, definitivamente, o problema da IoT, essa está disponível. Temos a tecnologia que precisamos e os parceiros para fazerem a sua integração. O desafio é integrar tudo isto em algo que é escalável e que resolva um problema de negócio.  

O facto de os sistemas serem abertos é uma tendência? 

Não. É uma necessidade. É impossível imaginar o digital de uma forma não aberta, porque isso implicaria que cada empresa fosse proprietária, simplesmente mataria qualquer tipo de inovação. Acreditamos na inovação enquanto um ecossistema aberto, desde software a redes, arquiteturas industriais… 

O vosso CEO afirmou recentemente que metade do negócio da Schneider Electric já vem da divisão de IoT. Como é que esta área se irá desenvolver nos próximos anos? 

Estes 50% são a evolução de vinte anos de crescimento. Fomos pioneiros ao conectar sistemas industriais. Agora tem acelerado, é verdade. Arriscaria dizer que a totalidade do negócio, na próxima década, virá da IoT. Se olharmos para os mercados verticais onde nos inserimos, não há produto que não esteja conectado, tudo libertará dados, tudo será IoT. Será uma tendência global para qual estamos muito bem posicionados devido à nossa história.