«Está na altura de as empresas pensarem em administrar os seus negócios em nuvens autónomas», disse em Barcelona John Van Siclen, CEO da Dynatrace, empresa de Gestão de Desempenho de Aplicações (APM) que organizou, na capital catalã, o seu evento europeu Perform Summit.
Van Siclen não estava a falar apenas de fornecedores de serviços em nuvem como a Amazon Web Services, a Microsoft Azure ou a Google Cloud. O CEO fala, antes, em companhias aéreas, bancos ou empresas de logística. A ideia do executivo é “simples”: se já podemos pensar em veículos autónomos, as empresas definitivamente deveriam poder usar software para construir nuvens autónomas, com ‘self-driving’.
Claro que, de acordo com Van Siclen, a Dynatrace está bem posicionada para ajudar os seus clientes a atingir este fim. Como? Segundo o responsável, através da combinação de instrumentação automática de TI, mapeamento de dependência em tempo real e o mecanismo de inteligência artificial (AI), que a Dynatrace apelidada de Davis. Um objectivo que o gestor diz ser altamente atraente em termos de eficiência, de tal forma que o dinheiro que os clientes estariam dispostos a gastar com isso faria com que a Dynatrace duplicasse, ou mesmo quadruplicasse, o seu actual tamanho. «Podíamos ser tão grandes ou mesmo maiores que a ServiceNow». Ora, esta frase que Van Siclen usou em Barcelona foi, no mínimo, ousada, pelo menos segundo os analistas e jornalistas da imprensa especializada, já que a também norte-americana ServiceNow teve receitas em 2018 de 2,6 mil milhões de dólares, qualquer coisa como 2,3 mil milhões de euros.
Vamos a “contas”
Acontece que, por ser propriedade da empresa de private Equity Thoma Bravo, a Dynatrace não divulga as suas receitas. Mas, de acordo com o portal Diginomica, uma estimativa de Março de 2019 da Gartner coloca as vendas da empresa (excluindo serviços profissionais) entre os 220,85 e os 550 milhões de dólares (485,88 milhões de euros). Desde que a Dynatrace revelou em meados de 2017 que as vendas totais tinham ultrapassado a marca de 400 milhões de dólares (353,36 milhões de euros), pode-se supor «com segurança», escreve o Diginomica, que o valor de hoje estará no limite superior da estimativa da Gartner, se não um pouco acima. Além disso, a maioria das estimativas do mercado de APM em receita mostra a Dynatrace confortavelmente à frente da rival New Relic, que registou vendas anuais no último ano fiscal de pouco mais de 479 milhões de dólares (423 milhões de euros). Ou seja, “contas” que vêm provar o quão ousada e audaz foi a afirmação de Van Siclen.
O potencial de crescimento da Dynatrace, pelo menos segundo os analistas e a imprensa que habitualmente faz a cobertura da marca — foi a primeira vez que a businessIT esteve presente num evento desta empresa — está igualmente indexado ao conceito de experiência digital, quer de funcionários, quer de clientes, com todas as esperanças a serem depositadas na ferramenta Session Replay, revelada pela primeira vez na conferência da empresa em 2018, em Las Vegas. Desde então, a Dynatrace lançou uma versão de produção dessa ferramenta, que recolhe um arquivo de registo para rastrear a interacção de um utilizador individual com uma aplicação digital. A empresa também o incluiu como parte de uma versão actualizada do motor Davis AI.
O objectivo da Session Replay é a «monitorização da experiência digital»: na verdade, é uma maneira de capturar, indexar e reproduzir visualmente a experiência digital completa que um utilizador específico tem, clique por clique. Isto está agora nas mãos de vários grandes clientes da Dynatrace, que falaram sobre o uso da ferramenta em Barcelona.
O poder da experiência
Na linha de cruzeiros Royal Caribbean International, por exemplo, o gestor sénior de operações de e-commerce, Carlos Gutierrez-Menoyo, usa o Session Replay desde o final de 2018. «Os clientes de comércio electrónico não têm paciência, exigem um óptimo desempenho e o nosso trabalho na Royal Caribbean é oferecer precisamente isso. Usamos muita tecnologia para os ajudar a reservarem um cruzeiro e prepararem-se para as férias. Mas, para o cliente, obviamente que a questão não se centra na tecnologia, centra-se na experiência e temos de nos certificar de que tudo é agradável para eles». Com esta ferramenta, Carlos Gutierrez-Menoyo diz ser possível ver se existiu algum problema, se houve hesitação na compra ou alguma área onde os clientes tiveram particular dificuldade. «Entendemos o fluxo e verificamos se houve algum problema no processo. Que podem ser pequenos detalhes: formatos de data, Reino Unido versus EUA, formatos internacionais de códigos-postais e assim por diante. Mas também podem ser problemas maiores: uma página que não está a carregar, um botão que não funciona…» Ou seja, diz o responsável que ao ver a forma como os utilizadores estão a interagir permite lidar com os potenciais problemas mais rapidamente e melhorar o fluxo geral.
Como a maioria das empresas, a Royal Caribbean já tem análises sobre taxas de abandono, por exemplo. Mas a vantagem em usar o Session Replay, diz Gutierrez-Menoyo, é que agora a sua equipa entende a história por trás das métricas: «Podemos saber qual a razão pela qual o cliente desistiu ou o carrinho de compras foi abandonado».
O futuro da Dynatrace
Fundada em 2005, a Dynatrace é uma empresa norte-americana especializada em gestão de performance digital. Em 2011, foi comprada pela Compuware, fornecedora de tecnologia para Gestão de Desempenho de Aplicações (APM) há mais de quarenta anos. Como resultado, a Dynatrace tornou-se uma linha de negócios focada em APM dentro da tradicional corporação de Tecnologia da Informação. Em 2014, a Compuware foi comprada pelo fundo de capital privado Thoma Bravo. Com a transacção, ocorreu a separação das marcas Dynatrace e Compuware (Mainframe). A Dynatrace assumiu os negócios de APM e herdou muitos clientes da Compuware em todo o mundo, como aconteceu de resto em Portugal.
A empresa tem sofrido nos últimos anos uma profunda transformação, o que foi confirmado em Barcelona por John Van Siclen. «A reinvenção do negócio foi definitivamente um pouco controversa», dizia o responsável referindo-se ao fundo Thoma Bravo. «Mas estão extremamente felizes. Na verdade, provavelmente dirão que a ideia foi deles», disse entre sorrisos. «Agora, quando levamos uma ideia – uma ideia como nuvem autónoma – eles acreditam, porque já demos grandes saltos executados com sucesso».
O que tudo isso significa para o futuro da Dynatrace é menos claro, dizem os analistas. Com um IPO, poderia ter um futuro como fornecedor independente de software, um resultado que Van Siclen mencionou mais de uma vez e talvez sua escolha preferida. Por outro lado, fala-se nos corredores que a empresa poderia ser vendida pela Thoma Bravo, se um potencial comprador fosse encontrado. Há um ano, a Bloomberg divulgava que ambas as hipóteses estariam em cima da mesa. Ou seja, uma empresa cujo percurso vai com toda a certeza valer a pena seguir.