Entrevista

«Somos uma empresa muito centrada nas pessoas e isso ajuda-nos a crescer de forma saudável»

Entrevista a Vitaly Sedler, CEO e co-fundador da Intellias.

A Intellias, fornecedor global de serviços de tecnologia, que recentemente abriu escritórios em Portugal, aposta nas pessoas para potenciar o seu negócio. A empresa nasceu na Ucrânia, há 21 anos, mas tem presença em todo o mundo e acredita que o País é «excelente» para captar talentos.

Apresentam-se como um «fornecedor global de serviços de tecnologia de informação». Em que sentido?

Por definição, somos uma empresa de serviços de engenharia de software. Por missão, ajudamos os nossos clientes a dar vida a grandes ideias através do poder da tecnologia digital. Basicamente, pegamos em ideias dos nossos clientes e ajudamos a implementá-las. Nascemos na Ucrânia, mas desde logo tivemos a certeza de que queríamos ter uma estrutura global. E aqui estamos nós.

A Intellias foi criada há 21 anos, numa realidade obviamente muito distinta. O conceito mudou muito ou a génese permanece a mesma?

Já foi, realmente, há muito tempo… naquela época, eu e meu co-fundador éramos uns jovens de 25 anos e apenas queríamos fazer o que realmente amamos: desenvolver código de software. Admito que, naquele momento, não pensámos bem sobre que tipo de empresa iríamos criar ou, sequer, se estaríamos no mercado dali a dezenas de anos. É verdade que a indústria mudou – hoje, todo o mercado e todas as empresas estão a fazer o seu caminho na transformação digital. Globalmente, todo o tipo de negócio é, agora, digital, independentemente da área ou sector onde actua. Estou particularmente feliz por fazer parte e contribuir para essa mudança.

Que impacto têm no negócio dos vossos clientes?

Temos um impacto muito forte e, sobretudo, muito positivo. Os nossos clientes têm ideias que, obviamente, gostariam de ver implementadas. Ideias essas que se tornam reais através da tecnologia. A nossa ajuda varia consoante as situações e os clientes. Para alguns deles, a nossa actuação é a de fornecer competências para implementar projectos. A Intellias é um dos principais especialistas no sector de mobilidade, sabemos tudo sobre sistemas de navegação, desenvolvimento, mobilidade e transportes… desta forma, explicamos aos nossos clientes como as suas ideias de negócio podem ser implementadas através da tecnologia. Ou seja, trazemos competências.

Podemos deduzir, então, que a Intellias não tem um portfólio clássico? Ou seja, que personaliza a sua oferta no sentido de materializar os conceitos dos clientes?

Sim. Basicamente, implementamos ideias em áreas onde temos algum know-how específico que possa fazer parte das soluções que entregamos aos nossos clientes. E, quanto mais desenvolvemos a nossa empresa, mais alargamos os pacotes de soluções, que depois podemos reaproveitar para outros clientes. Ou seja, o que fornecemos é sempre uma combinação entre serviços e algo já criado. Mas, na verdade, consideramo-nos uma empresa de serviços. Ajudamos organizações de uma variedade de sectores a criar produtos e experiências digitais inovadoras, usando uma profunda experiência em tecnologia emergente e uma cultura de produto de alto desempenho.

Na vossa cronologia, 2022 é apresentado como um ano repleto de novas apostas: Porto Lisboa, Espanha, Polónia, Croácia… este ano, planeiam ir para a Colômbia e para a Índia. Que percentagem do vosso negócio é feita nos mercados internacionais?

Na verdade, é perto dos 100%. Temos apenas dois ou três clientes na Ucrânia, desde o início que estávamos focados nos mercados globais. Fazemos cerca de 30% da receita na América do Norte – Estados Unidos e Canadá. E perto de 60% na Europa, desde o Reino Unido, à Alemanha, Áustria, Suíça e a alguns países nórdicos. Ainda não temos clientes em Portugal, mas é algo que irá mudar, de certeza, com a nossa presença. Temos ainda cerca de 10% do negócio a vir do Médio Oriente, em países como os Emirados Árabes Unidos e a Arábia Saudita. Portanto, temos um grande foco na Europa; depois, no grande mercado que é os EUA e, em seguida, uma parte no Médio Oriente. A receita na Ucrânia é residual.

Se não têm qualquer cliente em Portugal, por que é que decidiram investir numa presença local? Que estrutura têm aqui?

Temos, no geral, cerca de cinquenta pessoas, entre Porto e Lisboa. Neste momento, estamos a analisar o mercado nacional e vemos que há um forte potencial para programadores de mobilidade, em engenharia e tudo o que for relacionado com transportes e automóveis. Acreditamos que este tipo de engenharia é muito bom, em Portugal, mas também em engenharia genética, um mercado relativamente grande e em rápido desenvolvimento. No fundo, estamos a trabalhar com engenheiros que têm diferentes competências, desde engenharia de plataforma, de front e back-end a engenharia móvel, engenharia Web e a todos os diferentes tipos de desenvolvimento de software.

Fala-se muito na dificuldade em encontrar recursos humanos, nomeadamente recursos técnicos e especializados. Foi difícil recrutar pessoas para trabalhar em Portugal?

Na verdade, não gostamos de lhes chamar ‘recursos’, preferimos ‘talentos’. Presto atenção a isso porque é uma diferença muito significativa. Somos uma empresa muito centrada nas pessoas e isso ajuda-nos a crescer de forma saudável; podemos atrair pessoas em diferentes mercados, incluindo Portugal. Este mercado é bastante grande, creio que existem cerca de 150 mil engenheiros a trabalhar. Na Intellias, temos excelentes projectos, uma óptima cultura e ambiente de trabalho. Apoiamos as pessoas com desenvolvimento de carreira, formação e educação, para que se possam tornar melhores engenheiros. Acredito que isso são pontos que nos distinguem entre o mercado de talentos.

Como projectam o ano de 2023, em termos de negócio?

Diria que não irá registar um crescimento tão rápido quanto o ano passado. Aliás, se reparar, a Intellias é uma empresa de crescimento muito rápido. Se olharmos para os anos anteriores, crescemos 40, 50, 60% ano após ano. Por exemplo, no ano passado, apesar da guerra na Ucrânia, tivemos 55% de crescimento orgânico. Foi estranho, mas acredite que foi um dos mais bem-sucedidos, se olharmos apenas para os números.

Em contraste, 2023, por causa da recessão económica global, desacelerou e vemos menos negócio a entrar. Mas, a longo prazo, as condições de mercado para o nosso negócio são excelentes. Existem novas ondas de tecnologia, como IA, que vão precisar de muita engenharia e, depois, temos a automação de baixo custo. Somos uma empresa que cria produtos complexos, serviços complicados, o que significa que, durante muitos anos, haverá muita procura e uma boa base para crescer.

Conseguem identificar a razão que levou a que o ano passado tenha sido tão positivo?

Em certa medida, foi resultado do ano anterior, 2021. Após o período da pandemia, houve, realmente, um grande ‘hype’ no mercado, uma grande procura para implementação de projectos. Essa procura ainda continua e as empresas continuam a investir.

Quais os grandes desafios que têm vindo a enfrentar? Novas geografias? Reter os talentos?

Sim, esses continuam a ser desafios, mas temos conseguido lidar bem com eles. Admito que a questão dos talentos é particularmente importante. Durante muitos anos trabalhámos nisso, em criar um ambiente que potenciasse as pessoas, uma cultura muito forte e centrada nas pessoas, o que atrai engenheiros. Para nós, é mais fácil crescer. Temos conseguido ultrapassar questões, como atrair novos negócios, novos clientes, gerar mais competências, investir com sabedoria, para não gastar demasiado o investimento; e gastar em áreas de que realmente precisamos. Gosto de falar, especificamente, sobre o ano passado por causa da guerra na Ucrânia, onde temos uma grande parte dos nossos colegas. Não podíamos obviamente prever isso, mas estávamos preparados. Isso ajudou-nos a executar com eficiência o nosso plano de continuidade de negócios para realocar o nosso pessoal em zonas seguras e fora da Ucrânia. Assim, basicamente, em algumas horas, pudemos iniciar as nossas operações. O que não nos mata torna-nos, efectivamente, mais fortes. Somos uma daquelas empresas que não entende apenas como criar planos de desenvolvimento de negócio ou planos de continuidade de negócio, mas também como executá-los. Acho que, agora, estamos ainda mais bem preparados para lidar com situações desafiadoras.