As empresas portuguesas, privadas mas também públicas, têm sigo bastante ágeis na sua transformação digital, agora acelerada pelo contexto de pandemia. Em entrevista, Juan Rodríguez, Iberia country manager da F5, explica que, hoje, já não são apenas as grandes empresas a pensarem nessa transformação. As PME também estão na corrida.
Hoje, como se define a F5?
Há mais de 25 anos que a F5 se tem vindo a reinventar. Há três anos, provavelmente não responderia a esta pergunta de uma forma tão precisa como o faço hoje. Actualmente, a F5 é uma empresa especializada em serviços de aplicações. Sabemos que os principais activos das empresas são, precisamente, os dados e as aplicações, por isso começámos por fornecer alguns serviços básicos, como balanço de carga, application delivery controller… depois, fomo-nos movendo para a área de firewall das aplicações.
Ou seja, estamos muito focados em fornecer serviços às aplicações, sendo que essas aplicações são hoje bastantes diferentes das de há dois anos ou mesmo às de um ano. Aliás, todo o contexto COVID veio alterar um pouco este tema. Agora, as aplicações já não são tão monolíticas, são muito mais flexíveis e dinâmicas, muito mais pequenas e fáceis de programar, logo não necessitando de serviços tão sofisticados, mas antes igualmente dinâmicos e escaláveis: é aí que nos estamos a especializar.
Deixaram cair a denominação ‘network’ para se focarem apenas em ‘F5’. Por quê?
Porque claramente somos uma empresa que está nos serviços de aplicações em nuvem. Nesse sentido, comprámos recentemente a Volterra, uma aquisição que nos vai permitir reforçar a área de edge computing, já que os dados estão cada vez mais próximos das aplicações móveis, dos utilizadores.
Em todo este contexto, qual o comportamento da Ibéria, e sobretudo de Portugal, face ao dos restantes países europeus?
Recentemente, foi publicado um relatório sobre o sector público e, curiosamente, Espanha e Portugal estavam muito bem posicionados no que diz respeito à transformação digital e cibersegurança. É verdade que os dois países tiveram apoios da Comunidade Europeia neste sentido, nomeadamente as instituições financeiras ibéricas que lideram essa transformação. Por outro lado, por causa da COVID-19, o sector público também teve de acelerar a transformação digital, não só no sentido do teletrabalho, mas no da cibersegurança e da inteligência artificial. No que diz respeito ao nosso negócio, Portugal cresce mais rapidamente que Espanha.
Quais as razões?
São duas: Portugal está à frente da Espanha na adopção da transformação digital e no uso do e-commerce. Em termos de mentalidade e maturidade, o cidadão português está mais habituado a utilizar os serviços online, as aplicações móveis e foi pioneiro nas smart cities… isso faz com que estejam na linha da frente da transformação digital e em tudo o que lhe está associado, desde micro-serviços a aplicações nativas na nuvem e à cibersegurança.
O ano passado não foi, de todo, fácil. Mas é verdade que houve negócios que acabaram por ter melhor desempenho que em anos anteriores. Qual a realidade da F5? Tiveram de reajustar a vossa estratégia? Os números foram muito diferentes dos projectados?
Sem revelar números, posso dizer – e até me custa, porque sei que há muita gente a sofrer por causa da pandemia – que houve tecnologias verticais que cresceram. No nosso caso, crescemos na área de cibersegurança, foi um ano recorde. Ao início, os clientes estavam na expectativa do que ia acontecer, mas depois acabaram todos por investir nesta área. Depois, os clientes tiveram de mover aplicações e cargas de trabalhos de ambientes tradicionais e datacenters para a nuvem, precisamente para poderem abordar o tema pandemia. A transformação digital foi efectivamente acelerada. Ou seja, houve uma grande aposta em cibersegurança à volta dos micro-serviços e aplicações em contexto Web e móvel.
Ou seja, o ano não correu mal…
Exactamente. As perspectivas é de que, nos próximos trimestres, as coisas também não corram mal. Há muitas empresas que continuam a reforçar-se, não por causa da pandemia, mas porque querem avançar na transformação digital, tanto no sector privado, como no público, que, como já referi, tem recebido ajudas financeiras por parte da Comunidade Europeia. Em Espanha há o Plano 20-25 e sei que Portugal tem também vários projectos.
Recentemente, disse: «A transformação digital é uma oportunidade real para mudarmos os negócios tradicionais na Península Ibérica». A tipologia de clientes da F5 mudou?
Os actuais clientes estão a acelerar o passo face à transformação digital. Há clientes que estavam na fase 1, que é a automatização de processos, e estão a avançar já para a parte de gestão e monitorização de ambientes. Estamos igualmente a ser muito mais procurados por negócios de pequenas e médias empresas, que antes viam o tema da transformação digital como algo que estava longe e que agora o abraçam. Nomeadamente, como agora não têm um espaço físico para poder vender, têm de avançar de forma mais firme para o online, que é onde estão os compradores. Têm de se reinventar, de montar uma plataforma de e-commerce onde possam continuar a vender. Outro sector que nos tem particularmente solicitado é o MSP (Managed Service Providers), empresas que prestam serviços às PME e, como consequência, tiveram também eles um grande crescimento de clientes.
A F5 tem o negócio preparado para fornecer pequenas e médias empresas?
O core do nosso negócio continua a ser as grandes empresas, mas o produto está preparado para isso, além de que temos diferentes modelo de serviço, de consumo. Não temos apenas o ambiente tradicional de venda, com o cliente a comprar a licença, como temos o modelo de subscrição, de nuvem, de micro-serviço… ou seja, adaptamos os modelos às necessidades dos clientes.
Mas estando vocês tradicionalmente nos negócios de maior envergadura, uma PME pensa na F5 para fornecedor? O vosso ‘brand awareness’ não é propriamente forte neste mercado…
Por isso temos vindo a adquirir uma série de empresas que nos tem permitido posicionar nesse mercado. Aliás, mantivemos as marcas porque já são conhecidas. Um exemplo disso é a Nginx, que é líder de mercado em opensource nas PME, uma marca que continuamos a usar porque é muito forte. Com a Volterra é a mesma coisa, também vai ser mantida. Ou seja, dentro da F5 há marcas que são mantidas pelo seu conteúdo tecnológico e pelo seu conteúdo de brand awareness.
Como vai ser 2021? Hoje passou a ser mais complicado prever?
Os clientes vão continuar a consumir. As tendências até se podem alterar um pouco, mas creio que a área de cibersegurança vai continuar a ser muito requisitada, assim como a inteligência artificial e machine learning, mas sempre ligada à cibersegurança, com os clientes a quererem medir os vectores de ataque, a tentarem perceber onde o seu negócio vai ser impactado, assim como o tema de fraude, até porque as compras online estão a aumentar. Outra área que prevemos ser requisitada é a de serviços multicloud, com os clientes a levarem as suas cargas de trabalhos a diferentes ambientes de cloud, mas a quererem manter a mesma política de segurança, gestão e visibilidade. Creio que estas vão ser as grandes tendências para o próximo ano.
Quais são os grandes desafios de trabalhar com clientes portugueses?
Portugal está à frente de Espanha em algumas coisas, mas é verdade que não há muitas empresas de grande envergadura. Estamos presentes em tudo o que é banca, telcos… e, nesse sentido, o budget disponível é obviamente diferente. Os tipos de projectos não são tão grandes, mas há um grande número de empresas a investir em tecnologia. Ou seja, o maior desafio é a dimensão do mercado.
Porque há-de um cliente escolher a F5 como fornecedora?
Pela nossa trajectória, pelo facto de já termos tido muitos “noivos” e muitos quererem “casar” connosco. Nós continuarmos aqui, reinventando-nos e a comprar empresas. Somos uma empresa pequena, muito agressiva, dinâmica e que tem acordos com todos os fabricantes integradores do mercado, pelo que é somos uma aposta segura. Temos uma tecnologia muito robusta e reconhecida. Estamos orientados para o cliente, aliás, somos obsecados pelo cliente.