À medida que a pandemia começou a afectar (e infectar) o mundo, no ano passado, as empresas começaram a recorrer a todas as ferramentas à sua disposição – incluindo as de inteligência artificial – para responder aos novos desafios e aos clientes com segurança e eficácia. Uma pesquisa da KPMG de 2021 revelou que metade das organizações acelerou o uso de IA em resposta à COVID-19, incluindo 72% da indústria, 57% das empresas de tecnologia e 53% dos retalhistas.
A maioria está feliz com os resultados, pelo menos segundo este documento. Oitenta e dois por cento dos entrevistados concorda com o facto de que a IA tem sido útil para a sua organização durante a pandemia e a maioria diz que está a obter ainda mais valor que o previsto. Quase todos referem que o uso mais amplo da IA tornaria a sua organização mais eficiente e 85% deseja que a sua empresa acelere a adopção de ferramentas de inteligência artificial.
Ainda assim, o sentimento não é totalmente positivo. Isto porque, apesar de estarem dispostos a abraçar este novo conceito de inteligência, muitos executivos acreditam que o seu sector está a avançar demasiado rápido na sua adopção. Ou seja, defendem as ferramentas de inteligência artificial mas, ao mesmo tempo, confessam que são mais um “hype”, uma novidade, que uma realidade.
A IA e as interpretações erróneas
Andrade da Silva, docente e investigador no campo da inteligência artificial aplicada à gestão empresarial, admite que a novidade desta tecnologia permitiu interpretações erróneas. «Na verdade, a maioria dos empresários não sabe exactamente o que pode ou não esta tecnologia fazer e, mais importante, quanto tempo demora para obter resultados, quando aplicada a uma escala empresarial». Uma afirmação sustentada por mais um dado da KPMG: embora 79% dos entrevistados diga que a IA é pelo menos moderadamente funcional na sua organização, apenas 43% diz ser totalmente funcional em escala. Além disso, parece ainda ser comum encontrar executivos que pensam na IA como algo a ser comprado – como uma nova máquina – para entregar resultados imediatos. E embora possam ter tido algum sucesso com inteligência artificial – geralmente pequenas provas de conceito – muitas organizações aprenderam que escalá-la para o nível empresarial pode ser mais desafiador. «Requer acesso a dados limpos e bem organizados. Requer uma infra-estrutura de armazenamento de dados robusta, especialistas no assunto para ajudar a criar dados, skills sofisticadas de ciência da computação. Para além de requerer o envolvimento de toda a empresa, que esbarra muitas vezes em aspectos culturais que, todos sabemos, são as barreiras mais difíceis de transpor». Andrade da Silva deixa ainda escapar que, muito provavelmente, alguns players poderão ter exagerado no potencial da IA ou, pelo menos, não evidenciado o esforço necessário para obter os resultados previstos.
O investigador diz ainda que uma “luta” neste campo é a ausência de uma estrutura legal e regulatória estabelecida para orientar o uso da inteligência artificial. «Muitos empresários não têm uma visão clara do que a sua organização está a fazer para governar a IA, ou que regulamentações governamentais podem surgir neste campo. Compreensivelmente, estão preocupados com os riscos associados, incluindo o desenvolvimento de casos de uso hoje que os reguladores possam eliminar amanhã, desperdiçando tempo, dinheiro e recursos». Aliás, na pesquisa da consultora, a grande maioria dos executivos defende que o governo deve desempenhar um papel na regulamentação da tecnologia de IA.