Alguns analistas vislumbram a blockchain ser tão transformadora como a criação da própria Internet, com o poder de reorganizar os negócios e as transações. Vai trazer a tão desejada transparência virtual? Provavelmente é demasiado cedo para o afirmar, até pelas questões que levanta não só ao nível da segurança, mas culturais, organizativas e de governança.
Uma nova tecnologia está a redefinir o modo como fazemos transacções. A blockchain, onde “assenta” o ecossistema Bitcoin, tem o potencial de mudar a forma como compramos e vendemos, como interagimos com o Estado e a forma como verificamos a autenticidade de tudo. Desde títulos de propriedade até, diz a Goldman Sachs… vegetais orgânicos. A blockchain combina a abrangência da Internet com a segurança da criptografia para oferecer a todos uma maneira mais rápida e segura de verificar informações importantes e estabelecer confiança. Pelo menos, é assim que a mensagem nos é apresentada.
Vejamos: contractos, transacções e os registos destas actividades estão entre as estruturas que definem os nossos sistemas económico, legal e político. E basta pensarmos um pouco para percebermos que estes “trâmites” não fazem mais do que proteger activos, estabelecer limites organizacionais, estabelecer e verificar identidades, governar as interacções entre nações, organizações, comunidades e indivíduos.
E, no entanto, essas ferramentas – os tais contratos, transacções e os seus registos –, assim como as burocracias que se criam para gerá-las, não acompanharam a transformação digital da economia. Num mundo digital, parece certo que a maneira como regulamos e mantemos o controlo administrativo tem de mudar.
Blockchain vai revolucionar… tudo
A blockchain promete precisamente resolver esse problema. O do controlo. Aliás, vários especialistas internacionais com os quais nos “cruzámos” ao preparar este artigo garantem que esta tecnologia vai revolucionar tudo. Alguns até vão mais longe e comparam-na à criação da própria Internet. E a moeda virtual Bitcoin aos primórdios do e-mail.
A revolução da blockchain, no entanto, será feita sem “ruído”, será como o backoffice de todo o tipo de transacções, acontecendo sem que o utilizador sequer se aperceba do seu uso. A tecnologia que está no coração do Bitcoin e de outras moedas virtuais, é apresentada como sendo um livro aberto e distribuído que pode registar transacções entre duas partes de maneira eficiente, verificável e permanente.
Assim, com a blockchain, podemos imaginar um mundo em que os contratos são incorporados em códigos digitais e armazenados em bancos de dados compartilhados e transparentes, onde são protegidos contra a exclusão e a adulteração. Neste mundo, todos os acordos, todos os processos, todas as tarefas e todos os pagamentos teriam um registo digital e uma assinatura passíveis de serem identificados, validados, armazenados e compartilhados. Intermediários como advogados, corretores e banqueiros tornar-se-iam, no mundo da blockchain, desnecessários. E indivíduos, organizações, máquinas e algoritmos poderiam transaccionar livremente e interagir uns com os outros com pouco atrito. Este é o imenso potencial da blockchain.
Mas cuidado com o “hype”!
Quanto mais pesquisávamos, mais especialistas, opinon-maker, jornalistas especializados e revistas conceituadas exploravam o facto de a blockchain revolucionar negócios e redefinir empresas e economias. A Harvard Business Review, por exemplo, embora partilhe do entusiasmo pelo potencial desta tecnologia, preocupa-se com o “hype”. E levanta questões não só ao nível da segurança – a Mt. Gox, que já foi a maior bolsa de Bitcoins, entrou em colapso em 2014 depois de ter roubado mais de 470 milhões de dólares daquela moeda virtual. Diz a Harvard Business Review que, pela experiência que tem em estudar inovações tecnológicas, se houver uma ‘revolução blockchain’, muitas barreiras – tecnológicas, de governança, organizacionais e até sociais – terão que cair. E defendem que seria um erro precipitar-se a inovação da blockchain sem entender as suas consequências.
Ou seja, são vários os protagonistas que admitem que a verdadeira transformação de negócios e governança liderada por blockchain ainda está a muitos anos de distância. Isso porque a blockchain não é uma tecnologia “disruptiva”, que pode atacar um modelo de negócios tradicional com uma solução de custo mais baixo e ultrapassar rapidamente as empresas estabelecidas.
Blockchain é uma tecnologia fundamental: tem o potencial de criar novas bases para os sistemas económicos e sociais. Mas, embora o impacto seja enorme, todos parecem concordar que serão preciso décadas para que a blockchain se infiltre nas infra-estruturas económica e social. O processo de adopção será gradual e constante, não repentino, à medida que as ondas de mudanças tecnológicas e institucionais ganhem força.