Entrevista

«Daqui a cinco anos, gostaria de chegar aos cinquenta milhões de euros»

A entrevista a Octávio Oliveira, director da Atos Portugal.

Há dez anos em Portugal, a multinacional Atos insiste em adaptar o seu negócio à realidade portuguesa. Octávio Oliveira, responsável pelo mercado nacional, vê este projecto como pessoal e gostaria de, em cinco anos, triplicar, de forma orgânica, o crescimento da empresa. O objectivo é atingir os cinquenta milhões de euros.

Hoje, como define a Atos?

É uma multinacional que está presente no mercado nacional há cerca de dez anos e, tendo como maior accionista em nome individual a Siemens, tem uma génese muito grande de tecnologia de informação. Somos uma empresa que, estando presente no mercado nacional, tenta, na medida do possível – e não é fácil –, trazer todo um conjunto de boas práticas. E, acima de tudo, manter um ‘flavour’ nacional para que os nossos clientes sintam que (também) somos portugueses, que não somos apenas mais uma multinacional a estar presente em Portugal.

Ou seja, tentam adaptar a realidade da empresa ao nosso mercado?

Sem sombra de dúvida. Até porque – e isto diz-me a experiência acumulada – até posso ter a melhor solução do mundo, com a melhor referência que a empresa tenha algures, mas não ter a capacidade de, em Portugal, a implementar e ter o conhecimento para a tornar uma realidade. Não vale a pena.

Hoje, como é que gostam de se distinguir da concorrência? Além do que já referiu, de trazer alguma “portugalidade” ao negócio?

O objectivo que persigo é transmitir confiança aos nossos clientes. Até porque os nossos melhores vendedores são precisamente os nossos clientes. Se estiverem satisfeitos, mantêm-se connosco, referenciam-nos, passam a palavra de que somos capazes e confiáveis. Numa única palavra diria precisamente ‘confiança’.

As vossas áreas de actuação têm-se vindo a alterar nos últimos tempos? Ou, pelo menos, o peso delas no volume de negócios? Ou o foco tem sido mais ou menos o mesmo?

A vida muda todos os dias. O que é hoje o mundo das tecnologias da informação não tem nada que ver com o que era há trinta anos. A “constelação” das empresas, dos serviços e das necessidades é totalmente diferente. Diria que evoluiu muito. Até há alguns anos, dizia que a Atos era agnóstica relativamente aos produtos. Hoje, já não o posso dizer porque também os temos, focados na componente Unify, as antigas centrais da Siemens, e na Bull, que também é um produto Atos. Mas a componente de serviços, no nosso caso, continua a ser a principal. Diria que três quartos do negócio são serviços e o restante é produto.

Qual a actual estratégia para o mercado nacional, no próximo biénio?

A estratégia passa por podermos responder de uma forma efectiva ao que são os desafios actuais da nova realidade. Está-me a fazer esta entrevista [ndr: via zoom] e eu não sei em que localidade está. Esta forma colaborativa a que nos tivemos de adaptar nos últimos dezoito meses implica uma responsabilidade das empresas em ajudar o tecido empresarial português a continuar a fazer negócio de uma forma condigna e fácil. E colaborar é para dentro da empresa e para os nossos clientes. No início da pandemia disseram-me que a partir de agora os negócios iam passar a ter uma coisa chamada ‘factor COVID’, ou seja um factor inferior a um porque íamos negociar em baixa. Fiquei assustado porque vínhamos de um crescimento interessante e cheios de ambição. Quem o disse, estava certo. Há, efectivamente, um factor COVID, ele existe, mas felizmente é multiplicador porque veio tornar o mundo as tecnologias da informação mais importante. Veio tornar mais apelativo os serviços que hoje uma empresa que faz integração tem para oferecer e que podem ajudar não só os negócios mas a própria sociedade. Ou seja, o factor COVID existe mas é positivo – é evidente que preferíamos que não o tivéssemos…

Qual é o cliente-tipo da Atos?

Estamos presentes, sobretudo, no mercado do sector público e nas utilities. Também actuamos na área das telco.

Como empresa, que desafios enfrentaram nestes últimos tempos?

De um momento para o outro, acordámos com isto de uma pandemia, que nem sabíamos muito bem o que queria dizer ou, pelo menos, o impacto que poderia ter no nosso dia-a-dia em termos de prestação de serviços. Andámos anos a falar em disaster recovery, em recuperação de dados, em levantar operações num local a 100 quilómetros, colocávamos isto nas propostas… mas depois fomos confrontados com uma coisa tão simples como ter de colocar todos os colaboradores em casa. Na Atos, já estávamos muito habituados a fazer o homeworking, estávamos preparados pelo que não sofremos com isso.

E os vossos clientes?

Foi uma agradável surpresa. A maioria dos nossos clientes – que têm um elevado nível de maturidade – teve a capacidade de lidar com a realidade. Houve realmente uma situação um pouco mais complicada, em que levámos cerca de uma semana e meia até garantir condições para fazer teletrabalho. E acabámos por levar para esse cliente a nossa própria experiência em trabalho remoto. Assim o fizemos e assim se mantém.

Diz-se que o modelo híbrido veio para ficar, um misto de teletrabalho e presencial. Por outro lado, estudos apontam que as chefias, sobretudo as intermédias, não sabem liderar sem ter as pessoas ao seu lado. Como acham que vai ser os próximos tempos?

Na Atos, como já referi, o teletrabalho já existia. Tivemos uma reunião interna onde comunicámos que o trabalho remoto já não é obrigatório e salientámos a toda a equipa que o escritório está oficialmente aberto e disponível. Porque há uma coisa importantíssima: o ser humano é, por natureza, social. A maioria dos nossos colaboradores acredita que as ferramentas colaborativas tecnologicamente são excelentes, mas o sentimento, a percepção é diferente. As empresas são as pessoas, que foram feitas para estarem juntas. Acho que nada vai ser como antes, mas acredito que o modelo híbrido já se mantinha. Já nos clientes, é um misto. Há realmente organizações que preferem ter os trabalhadores por perto, de ter as equipas juntas, nas suas instalações. Sentimos que assim que se começa a falar em desconfinamento, começam a pensar em datas para se voltar ao escritório.

Entretanto, criaram um centro de competências no Algarve. Porque escolheram esta geografia?

Havia um conjunto de factores que tínhamos que cumprir. Um deles era estarmos perto de uma universidade, de um polo de formação que trabalhasse connosco. Fizemos um levantamento de todas as universidades do País em termos que protocolos elas já tinham para ver onde havia carências. E reparámos que toda a gente se tinha esquecido do Algarve. E ainda bem que isso aconteceu. Porque hoje temos uma primazia junto à Universidade do Algarve e um carinho fantástico. Não somos mais um, somos ‘o’. Temos um apoio fantástico do Estado, em termos de Instituto do Emprego e Formação Profissional, na colocação de pessoas e somos tratados muito bem. Além de que me apraz sentir que contribuímos de uma forma decidida para reter uma população que teve condições de estudar e se pode manter junto das suas famílias. Se não houvesse uma entidade empregadora como nós, iam acabar os cursos e ter de rumar a Lisboa ou Porto.

O que é entregue a partir do Algarve?

Constituímos um conjunto de equipas por áreas tecnológicas que trabalham em duas vertentes. Uma vertente para projectos portugueses, de clientes nacionais, e outra de exportação de know-how. Ou seja, trabalhamos para clientes Atos que estejam no exterior. Neste momento está em crescimento exponencial o projecto de apoio a operadores 5G. Iniciámos o ano com cerca de trinta pessoas no Algarve, neste momento estamos quase a atingir as 50 e vamos chegar ao final do Verão com cerca de noventa colaboradores. No final do ano, seremos cerca cem.

Onde gostaria de ver a Atos em Portugal daqui a uns anos?

Entendo isto como um projecto pessoal. Dentro de cinco anos, gostaria que a Atos estivesse, em termos de volume de facturação, no triplo do actual.

Que, actualmente, é de quanto?

O ano passado tivemos uma facturação de quinze milhões e este ano vamos crescer, decididamente, já não há dúvidas. Daqui a cinco anos, gostaria de chegar aos cinquenta milhões de euros, em crescimento orgânico.