Entrevista

«Queremos ajudar as empresas a estarem mais perto dos pólos de inovação»

Entrevista a Miguel Ricardo, director-geral do Sítio.

Miguel Ricardo @ Hugo Alves/Sitio

Muito mais que um espaço físico, o projecto Sítio apresenta-se como um elemento facilitador, dotando as empresas de flexibilidade para gerirem as suas equipas, enquanto potenciam ecossistemas de inovação, aproximando a academia do mundo empresarial.

Como nasceu o projecto Sítio?

É um projecto 100% nacional, que nasceu com dois sócios arquitectos que tinham demasiado espaço para as suas necessidades e resolveram avançar num conceito de coworking, que evoluiu para flex office. Hoje, somos quatro sócios com uma aposta em coworking e coliving. Dois dos sócios vieram da área da hotelaria, o que trouxe uma percepção de serviço complementar ao espaço físico.

O primeiro espaço foi em Lisboa?

Sim, mais especificamente em Alvalade. Depois, a rede foi crescendo em Lisboa e avançou para Setúbal, seguiu para Aveiro, Porto e Guimarães. Neste momento, temos onze espaços.

Têm parcerias com entidades como a Unicorn Factory, a Fintech House e orgulham-se de ser um ponto de encontro dinâmico para o ecossistema das startups e PME em Portugal». O que oferecem de diferenciado, especificamente, a estas de empresas?

Basicamente, criamos comunidades de ecossistemas de inovação. Começámos a especializar-nos mais em verticais com a Portugal Fintech, na Fintech House, que, neste momento, é um caso de sucesso internacional, pois agrega muitas empresas do ecossistema de fintech. Ou seja, é uma abordagem muito baseada em startups e empresas inovadoras, mas também onde juntamos fintech, protech, insurtech e rech tech para criar um ecossistema ainda mais rico. Temos outros espaços que não estão orientados especificamente a um vertical, mas em todos eles temos agendas ricas em eventos e as empresas, nos espaços mais pequenos, são convidadas a vir também participar nos eventos que disponibilizamos na rede. Com esta parceria que estamos a desenvolver com a Unicorn Factory, já abrimos o hub de Web3 baseado na tecnologia blockchain em Alvalade, em Lisboa, e inaugurámos o hub de inteligência artificial. Este é um modelo que queremos desenvolver, pois acreditamos ser muito rico para as empresas, sobretudo destes verticais, pois estando todas dentro do mesmo ecossistema o networking fica facilitado.

O que oferecem além do espaço físico e dos já mencionados eventos?

Os nossos espaços são espaços de trabalho pensados em comunidade, com zonas comuns capacitadas para fazer eventos e networking entre as várias pessoas e empresas. Além disso, com parceiros como a Unicorn Factory e a Portugal Fintech, fazemos programas que podem ir desde programas de incubação, programas de aceleração e temos redes de mentores a apresentar as startups a potenciais investidores, a fundos de capital. Ou seja, uma gama vasta de serviços que são proporcionados nestes hubs, para além do espaço físico. Enquanto Sítio, somos parte deste sistema mais complexo e – porque é o que sabemos fazer melhor –, gerimos o espaço físico e a operação desse mesmo espaço. Depois, para cada uma das outras questões, temos parceiros especializados.

O que é, exactamente, o hub de inteligência artificial?

É uma parceria com a Unicorn Factory na qual contamos com parceiros ‘corporate’ do espaço: a Microsoft, a Altice, a Accenture e o Center for Responsibility AI. Já temos também algumas startups relevantes no ecossistema de inteligência artificial, em Portugal, que se estão a juntar e que vão estar presentes no espaço. Pretende-se criar um hub que seja referência a nível nacional e internacional para a inteligência artificial, que facilite a adopção por empresas ou, mesmo, por entidades governamentais.

Como funciona o vosso modelo de negócio? Os espaços são vossos ou alugados? O retorno é mais ou menos de quanto tempo?

Os espaços são todos arrendados. O que pode variar é quem faz a obra no espaço, se somos nós ou se são os proprietários. Estamos a tender cada vez mais para um modelo em que o proprietário fará as obras, nós operamos e, obviamente, isso é convertido numa renda maior. O retorno depende muito do espaço e do investimento que é necessário fazer em cada um deles. Temos espaços que vão desde os 800 metros quadrados até os 2400. Portanto, são espaços bastante diferentes e em cidades também elas distintas – temos espaços – por exemplo, os de Guimarães e Gaia – totalmente novos. Os edifícios são construídos para serem espaços de trabalho. Depois, temos outros localizados em prédios mais antigos e que tivemos de converter, por exemplo, o de Alvalade, no qual estamos a fazer a obra completa. Portanto, o edifício ficou só numa estrutura e fizemos uma obra total para adaptar ao uso futuro.

Qual tem sido a taxa de adesão ao vosso projecto e como têm lidado com as mudanças, como a pandemia?

Que estraA pandemia foi, de facto, o grande desafio que tivemos nestes dez anos. De repente, os espaços ficaram muito desocupados e tivemos de baixar bastante o preço para os voltar a ocupar. O pós-pandemia também alterou significativamente o modo de relação das pessoas com o trabalho. As empresas passaram a ter muita gente em modelo híbrido ou totalmente remoto e também nós, cujo negócio são os espaços de trabalho, tivemos de nos habituar a adaptar a esta realidade. Mas acredito que somos mesmo uma solução para esta nova realidade: providenciamos uma grande flexibilidade, valência na qual vamos continuar a apostar, e ajudamos as empresas a crescer ou decrescer e a adaptar o espaço às suas necessidades. Por outro lado, temos know-how e, quando estamos a construir espaços de trabalho, percebemos o que é que as pessoas valorizam mais e menos. Desta forma, conseguimos criar espaços cada vez mais competentes e aprazíveis, para trazer um maior conforto e felicidade aos seus utilizadores.

Que estratégias têm para captar clientes?

Queremos facilitar o processo de recrutamento das empresas, queremos ser parte da solução para manterem os seus colaboradores mais felizes. Por exemplo, temos um serviço de café com uma outra marca, a Pitaya, exactamente com o objectivo de poder trazer pequenos-almoços para o escritório, poder servir catering, fazer eventos de networking, after work… na Fintech House, outro exemplo, todas as quintas-feiras temos um evento pós-trabalho em que as pessoas são convidadas a beber um copo e conversar, uma altura em que se juntam várias pessoas com necessidades em comum. No fundo, reforço que somos muito mais que um espaço físico e é verdade que nos temos adaptado, pois, nos últimos anos, a realidade mudou um pouco, embora acredite que seja a favor dos espaços flexíveis.

Como preveem a evolução do trabalho presencial vs. remoto no futuro?

Acho que este modelo vai fazer cada vez mais sentido para as empresas – primeiro, dotando-as da já referida flexibilidade; depois, porque acredito mesmo que o nosso trabalho também é ajudar os clientes a terem os seus colaboradores mais satisfeitos, para que as empresas se possam preocupar e focar no seu negócio. Neste momento, acho que a única forma que faz sentido para as pessoas voltarem ao trabalho presencial é se tiverem condições e serem felizes. Se for só por obrigação, não creio que vá funcionar. Hoje, os colaboradores querem muito mais que um ordenado ao final do mês, se não se sentirem confortáveis no local de trabalho, ou se não tiverem flexibilidade para gerirem a sua vida facilmente, procuram outra empresa. Se não houver algo mais forte que, efectivamente, os faça ir para o local de trabalho, será mais complicado retê-los. A questão da flexibilidade é fundamental, porque uma empresa já não precisa de ter cempostos de trabalho, se calhar precisa ter sessenta. E, depois, de repente, há um projecto em que é preciso as equipas estarem em formato mais presencial e alugam mais umas salas. Ou, ao contrário, desocupam. Este modelo é fundamental e cada vez fará mais sentido, no futuro.

Existe alguma geografia em que estejam particularmente interessados em estar presentes?

Neste momento, e com esta estratégia, olhamos para todas as cidades onde há uma grande capacidade de inovação, muito perto da academia, das universidades. Queremos estar próximos das universidades para também ser mais fácil às nossas empresas recrutarem e manterem as pessoas próximas das zonas onde nasceram, cresceram, estudaram… nem todos têm de estar em Lisboa ou Porto e nas grandes cidades. Por exemplo, fomos para Guimarães para o MITH, o Minho Innovation Technology Hub (um projecto muito interessante promovido pelo Grupo Casais em parceria com a Câmara de Guimarães), a Universidade do Minho, a Tech Minho e o Sítio.

O objectivo é que as empresas de Guimarães e do Minho possam desenvolver os seus negócios naquela geografia, usufruindo da inovação local. Agora, estamos a tentar dinamizar, junto dos operadores daquela área, criar um têxtil tech, um hub direccionado para este sector, um vertical que faz todo o sentido desenvolver naquela região. Queremos ser dinamizadores desta evolução. Queremos ajudar as empresas a estarem mais perto dos pólos de inovação e olharemos sempre para novas oportunidades.

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