A inteligência artificial está presente em diversas áreas de actividade e o sector da saúde não é excepção. Maria do Céu Patrão Neves, presidente do CNECV, e membro do grupo de trabalho responsável pelo Livro Branco, explicou que a IA «tem vindo a expandir-se com benefícios evidentes, mas também com riscos» e que, por isso, é necessário «desenvolver uma consciência esclarecida através de informações rigorosas e actualizadas» para garantir que se beneficia de «todas as vantagens que a inovação tecnológica disponibiliza». A responsável indicou que foi o AI Act que motivou a iniciativa do Conselho para «especificar as orientações a desenvolver a nível nacional no domínio da biomedicina».
Na sessão, Rui Nunes, coordenador do grupo de trabalho do CNECV, revelou que a IA «vai levar a uma mudança de paradigma», porque, «a partir do momento que a inteligência artificial influenciar decisivamente o acto médico, vai ser necessário redefinir todo o sistema de responsabilidade civil por danos, nomeadamente a questão da definição da culpa». Já Miguel Ricou, relator e membro do grupo de trabalho, salientou que a capacidade de a IA fazer diagnósticos poderá levar a que os profissionais «deixem de ter capacidade de serem críticos», que as pessoas «acreditem mais na tecnologia que nos humanos» e ponham em causa os diagnósticos. Assim, na perspectiva do CNECV, os profissionais de saúde «não podem abdicar da responsabilidade da decisão».
Humanos têm de estar no centro
O Regulamento da Inteligência Artificial da União Europeia pode «servir de base para uma abordagem mais específica para a área da saúde», disse Inês Godinho, relatora e membro do grupo de trabalho. A responsável esclareceu que a «centralidade do humano, a supervisão humana, a transparência, a segurança e a responsabilização» são «princípios éticos nucleares» para uma «IA de confiança». Maria do Céu Patrão Neves realçou as cinco grandes áreas de intervenção que o Livro Branco prevê para o uso responsável da IA e que têm como objectivo «ajudar o legislador».
A responsável voltou a frisar que a utilização da IA se deve «centrar no humano» e que «não o deve substituir na tomada de decisão». Assim, na área da investigação biomédica, a primeira área de intervenção, os sistemas de IA devem «salvaguardar a criatividade intelectual», não devem «colocar em causa a replicabilidade e a explicabilidade dos processos de investigação», têm de ter em «consideração a protecção da privacidade e da confidencialidade» e vão obrigar a «reapreciar os critérios de autoria e integridade científica».
No segundo plano, a assistência clínica, a presidente do CNECV falou da necessidade de se «manter a humanidade, o processo de decisão centrado no diálogo entre o médico e doente sem prescindir de todas as mais-valias que a inteligência artificial traz». Além disso, o c«onsentimento informado tem de ser adaptado» e é preciso «conferir a verificabilidade dos sistemas digitais». Na área da gestão hospitalar, a responsável considerou que a IA pode «optimizar» a mesma, mas terá de se garantir a «qualidade dos cuidados» e «manter o cumprimento das regras da medicina baseada na evidência».
No quarto domínio, o da administração da saúde pública, a inteligência artificial poderá trazer uma «proximidade da comunicação entre todos os serviços» e a «coesão em todo o País» com «decisões centralizadas, padronizadas e, harmonizadas». Por último, é preciso apostar no ensino, na educação e na saúde para que exista «capacidade técnica dos profissionais de saberem utilizar as novas ferramentas, prestarem melhores cuidados de saúde» e promover a «literacia digital dos cidadãos», para estarem informados.
No final, Maria do Céu Patrão Neves realçou a importância do «espirito crítico» (já que é a «diferença entre a informação e o conhecimento») e sublinhou que a «ética é fundamental» e não uma barreira: «É, antes, uma necessidade para nos mantermos humanos no espaço do desenvolvimento científico e tecnológico».