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O (incerto) valor da economia dos dados

Todos sabemos que os dados têm valor. Não sabemos é qual. As maiores empresas do mundo já baseiam os seus negócios nos dados e os algoritmos de inteligência artificial consomem dados em massa. Mas os dados não são como bens e serviços normais. Além de poderem ser usados repetidamente, têm efeitos colaterais, positivos e negativos. Bem-vindos à nova economia dos dados.

Gémeos digitais e mundos-espelho
A economia digital trouxe igualmente novas personagens ao seu já elaborado enredo, como os ‘gémeos digitais’ ou os ‘mundos-espelho’, conceitos que já existiam, mas que agora ganham um novo protagonismo.

Hoje, o ciclo de vida dos produtos diminuiu em 25%, o que significa que os novos produtos devem ser desenvolvidos e lançados mais rapidamente. O ‘time-to-market’ é crucial e os denominados gémeos digitais são, cada vez mais, uma saída e solução, sobretudo para o sector industrial. A maioria das empresas ainda segue um modelo tradicional em que a qualidade só é confirmada após os componentes de um produto estarem prontos para serem testados.

Com o gémeo digital, as indústrias podem usar dados para simular testes antes de qualquer peça ser fabricada. O tempo de produção diminui e o produto pode ser lançado no mercado com mais rapidez. Algo que, por exemplo, vimos em Parma, com a Dallara, empresa de carros de competição, que recria o ambiente perfeito de corrida para melhorar os automóveis. Mas há muitos mais exemplos: a tecnologia dos gémeos digitais também pode ser usada em processos dentro das fábricas. Os testes de ergonomia são igualmente apontados como casos de estudo, sendo possível planear a melhor posição do colaborador numa linha de produção, por exemplo, ou a melhor maneira dele segurar um objecto, aumentando a sua produtividade.

Fabricantes de máquinas também conseguem utilizar gémeos digitais para optimizar as funcionalidades dos equipamentos. Os dados da máquina “real” podem ser carregados num modelo, ainda na fase de design. Isso resulta num gémeo digital capaz de simular as operações e fluxo de trabalho ao longo do tempo útil da máquina.

Os gémeos digitais são apenas uma parte de toda esta mudança na economia mundial. São eles que povoam o que David Gelernter, da Universidade de Yale, previu como “mundos-espelho” ou “universos-espelho”: uma nova dimensão da vida humana baseada e alimentada por dados. Ano após ano, cada vez mais partes do reino físico estão a ser representadas e simuladas no mundo virtual – uma inversão da teoria de Platão de que os objectos do mundo real são apenas cópias imperfeitas do seu verdadeiro ser no reino espiritual. O surgimento desses mundos-espelho veio, assim, alimentar a nova economia dos dados.

Como irá crescer a economia dos dados
De acordo com um relatório das Nações Unidas, a recolha de dados representa mais de cem milhões de empregos no mundo e 6,5% do PIB global. Com o tempo, estes números continuarão a crescer. À medida que a tecnologia melhora, as empresas poderão recolher dados com maior eficiência, aumentando potencialmente a capacidade de crescimento na economia de dados.

Mas, de acordo com o economista e consultor António Duarte Mendes, os analistas e economistas podem estar a superestimar a capacidade dos dados de sustentar um crescimento de longo prazo, o que tem implicações na forma como os dados devem ser avaliados hoje, de resto uma opinião sustentada por vários analistas.

No estudo Um Modelo de Crescimento da Economia de Dados, Maryam Farboodi (MIT) e Laura Veldkamp (Universidade de Colombia) argumentam que é errado equacionar as possibilidades disponíveis através do crescimento de dados com as infinitas possibilidades inerentes à economia de ideias e tecnologias. «Uma visão da economia do séc. XX é que o crescimento económico pode ser sustentado pela acumulação de ideias», diz o relatório. «Colocar ao mesmo nível dados e ideias significa que mais dados resultariam em crescimento infinito». Uma premissa que alguns analistas dizem ser errada.