A última caminhada
Assim, num esforço para se protegerem, as empresas inundaram as tais caixas de entrada dos seus clientes com solicitações de email para actualizar o seu consentimento para receber material de marketing.
Esses pedidos vieram em muitas formas – em Portugal, nas redes sociais, a Via Verde ganhava lugar de destaque com um carinhoso pedido de renovação de votos. «Do meu lado, prometo continuar a cuidar-te e respeitar-te todos os dias das nossas vidas. Fica comigo. Aceitas?».
O temido email RGPD ultrapassou as fronteiras europeias. Clientes fora da UE também começaram a receber solicitações intituladas ‘Actualizar Política de Privacidade’ ou ‘Os seus dados pessoais são importantes para nós’. Normalmente, os emails eram verbosos e continham saudações excessivamente familiares, seguidas por um conteúdo legal impenetrável. Às vezes, as empresas aproveitavam para nos vender alguma coisa. Era o fim do mundo em forma de email.
The Day After – o Dia Seguinte
Há duas formas de encarar o dia seguinte do RGPD, concretamente em Portugal. Vai haver empresas que simplesmente vão cumprir com os requisitos mínimos, satisfazendo as “necessidades” do regulador, e empresas que vão aproveitar o regulamento para trazer mais-valias à organização. «Essas são as empresas que realmente vão tirar partido do RGPD», disse à businessIT David Oliveira, director da EY.
O problema é que em Portugal o trabalho a fazer foi muito. Porque, ao contrário dos já mencionados Alemanha, Espanha ou Inglaterra, as empresas portuguesas partiram de uma base muto ténue, com um regulador que basicamente não regulava.
Ou seja, já existiam leis e obrigações cujo cumprimento não era fiscalizado. Empresários e alguns peritos consultados pela businessIT e que preferiram não ser identificados, admitiram mesmo que, até agora, era mais fácil pagar a multa do que prepararem as suas empresas para o cumprimento dessas obrigações. Algo que, de resto, David Oliveira corroborou.
O exemplo da crise do subprime
Há um ponto de vista que tem sido pouco explorado neste contexto do RGPD e que David Oliveira considera fundamental. Há onze anos, o mundo assistia à denominada crise do subprime, uma crise financeira desencadeada em 24 de Julho de 2007, a partir da queda do índice Dow Jones e motivada pela concessão de empréstimos hipotecários de alto risco. Uma prática que acabou por arrastar vários bancos para uma situação de insolvência, com fortes repercussões sobre as bolsas de valores de todo o mundo.
Na altura, a sociedade culpou os bancos e as empresas pelo incentivo ao crédito e pela forma como aliciavam os clientes ao consumo. «O regulamento vem trazer regras mais apertada neste sentido. Existe um investimento grande do lado das organizações em cumprirem, mas também existe o lado benéfico que isto pode trazer à sociedade como um todo. É claro que, a partir do momento que consentimos receber uma série de acções publicitárias, estamos expostos e haverá sempre quem progrida para o consumo exagerado e até excesso de crédito. Mas, com estas restrições, acredito que a probabilidade diminua. A longo prazo vamos sentir isso».