A Visa já não é apenas uma marca de cartões de crédito. Passado sessenta anos, a empresa assume-se como uma tecnológica que disponibiliza soluções na área dos pagamentos. Paula Antunes da Costa, country manager da Visa para Portugal, explicou à businessIT de que forma é que a pandemia veio acelerar a utilização de novos meios de pagamento e o que podemos esperar do futuro, em termos de inovação.
Actualmente, como define a Visa?
É uma empresa de tecnologia, uma empresa de soluções tecnológicas na área dos pagamentos. Deixou de ser aquela empresa que muita gente ainda associa a uma marca de cartões de crédito, hoje somos muito mais que isso. Somos uma empresa que tem um conjunto de soluções e tecnologias incorporadas na sua plataforma e que pretende trazer ao mercado – quer aos consumidores, instituições financeiras, negócios ou governo – soluções de ‘money movement’, de movimento de dinheiro, que vão muito além do que associamos a um acto de pagamento em ponto de venda.
A Visa tem vindo a evoluir de muitas formas, até acho que pode ser considerada a fintech original, quando foi fundada há sessenta anos. Passados todos estes anos, é uma plataforma de plataformas, uma rede de redes nas quais incorporamos soluções e tecnologias que permitem fazer esta conectividade entre consumidores, empresas, negócios…
Essa ideia já passou para o mercado?
As marcas, quando são muito fortes, às vezes sofrem dessa mesma robustez. A marca é tão forte, e esteve tantos anos associada a toda a parte de pagamentos com cartão, que é natural que as pessoas ainda a vejam assim. Mas é um caminho que tem vindo a ser feito do ponto de vista de comunicação, de divulgação, quer junto dos consumidores, quer dos negócios, mostrando que a Visa oferece soluções muito mais amplas que apenas o pagamento com o cartão. É uma entidade que pretende ser um ‘enabler’, que ajuda a fazer pagamentos e transferência de dinheiro. Uma entidade de tecnologia e de soluções de pagamentos mais global.
Apesar de tudo, a Visa não é uma nativa digital. Como foi o vosso processo de digitalização?
Na prática, já fazíamos um pouco a digitalização antes de isso “existir”. Fomos os precursores da electronização dos pagamentos, a palavra ‘digital’ é que surgiu um pouco mais tarde, mas foi exactamente isso o que o nosso fundador, Dee Hock, fez há sessenta anos, quando teve a visão de transformar o dinheiro físico em dinheiro virtual, digital, que permitisse fazer pagamentos em qualquer parte do mundo.
Como é que a Visa olha para o mercado nacional?
Portugal é um mercado muito importante para a Visa, é um ecossistema muito interessante e tem vindo a ter uma aposta significativa. Um dos pagamentos no qual temos vindo a investir é no contactless e é interessante que a adopção por parte dos consumidores seja muito forte. Quando o consumidor entende a tecnologia, a solução, os seus benefícios e vantagens, adopta-a rapidamente. A verdade é que, há um ano, a penetração do contactless estava nos 8%, e agora o Banco de Portugal divulgou que a evolução dos pagamentos por contacless está nos 30%. Isto é muito importante, porque durante algum tempo, talvez fruto do desconhecimento e falta de experimentação, o nível de adopção era bastante baixo. Aliás, Portugal era o último país da Europa na sua utilização, estávamos na cauda. Com a pandemia e o trabalho que foi feito com o Banco de Portugal e as mais diversas entidades financeiras, houve um esforço em facilitar os pagamentos, até porque as pessoas sentiram a necessidade de não tocar nos terminais. Tudo isso acabou por fazer com que os reguladores aumentassem os limites dos pagamentos por contacless e as pessoas começaram a experimentar. Isso mostra que os nossos consumidores, quando experimentam e percebem, aderem.
A pandemia veio acelerar a adopção dos pagamentos por via eletrónica? Houve um maior volume de transacções neste período?
Claramente. Aliás, essa foi a principal alteração que vimos e que acreditamos que veio para ficar. A COVID-19 acelerou uma alteração dos hábitos dos consumidores. Numa primeira fase porque foram forçados a fazê-lo, mas cremos que será uma tendência permanente, não conjuntural. Temos vindo a registar menos levantamentos em dinheiro, com os consumidores a usarem mais os pagamentos eletrónicos, seja com cartão, telemóvel ou dispositivos móveis, quer em ponto de venda quer online.
Os pagamentos digitais foram impulsionados pela pandemia, mas acreditamos que, mesmo após as pessoas retomarem os seus hábitos, vão continuar a usá-los, já estão incorporados no seu dia-a-dia. No caso do e-commerce, de acordo com o Banco de Portugal, a penetração dos pagamentos online é cerca de 9% do total dos pagamentos com cartão. Achamos que são tendências que já estão enraizadas.
O que vai ser o futuro? O que podemos esperar?
Não vamos fazer desaparecer as soluções que existem. Vamos, sim, adicionar soluções e dar novas opções aos consumidores. As pessoas vão optar pela ferramenta ou solução de pagamento mais conveniente a cada momento. Vamos continuar a ter pagamentos com cartão e vai haver a evolução dos pagamentos móveis, com soluções do tipo Apple Pay ou Google Pay, baseadas numa tecnologia chamada tokenização que permite conferir mais segurança às transacções.
Aliás, o caminho da inovação passa por trazer uma maior segurança às transacções, nomeadamente à medida que caminhamos para o espaço digital, onde existe um maior risco, uma maior exposição global dos nossos dados. Daí que estas novas ferramentas como a tokenização são muito importantes. Ou seja, se por um lado, dão-nos mais flexibilidade e possibilidade de incorporar outros meios e suportes, como os telemóveis, dão-nos mais segurança.
Estaremos então a falar, não em tecnologias ou soluções disruptivas, mas antes na consolidação e ganhos de maturidade nas existentes?
Sim, sobretudo mais maturidade. Mas vão existir disrupções, nomeadamente em áreas como a biometria associada aos pagamentos. É algo que já existe – nos telemóveis fazemos o pagamento com autenticação por impressão digital – mas estamos a trabalhar em soluções mais avançadas, no que chamamos de biometria comportamental, onde é incorporada a forma como eu sou, como ando, como pisco os olhos… comportamentos biométricos únicos. No limite, passaremos a mão por cima de um terminal de pagamento e não ter de utilizar qualquer suporte. As impressões digitais comportamentais validariam o pagamento. No futuro, vamos ter credenciais de pagamento, ao invés de cartões de pagamento. Essas credenciais podem estar suportadas em diferentes infraestruturas, como o telemóvel, o relógio ou até estarem associadas à biometria da minha mão. Deixa de existir o cartão físico como hoje o conhecemos.
Vai haver a completa desmaterialização dos pagamentos?
Sim, vai haver uma invisibilidade dos pagamentos. As soluções vão estar lá, desenvolvidas e suportadas pela Visa, mas as pessoas, no dia-a-dia, não vão dar por isso, e é assim que queremos que seja, porque significa que estão a funcionar.
Falou na segurança dos pagamentos. Hoje já existe menos medo de usar as novas formas de pagamento, nomeadamente no mundo virtual? Houve muita sensibilização neste sentido?
Isto faz parte da tal invisibilidade de que falávamos. A Visa, e a indústria em geral, tem uma abordagem multicamada, ou de vários níveis, em termos de segurança. Temos ferramentas que são disponibilizadas, quer aos comerciantes, quer aos emissores, para que eles possam melhorar os seus métodos de prevenção e combate à fraude, por exemplo. Soluções que são invisíveis para o utilizador, mas que estão lá na altura de ajudar os emissores a tomarem as decisões, seja para autorizar, ou declinar a transacção, caso tenha um risco associado. [Text Wrapping Break]Além de todas estas soluções, o consumidor também está protegido. A Visa tem regras que protegem o consumidor quando ele faz compras online.
Por exemplo, quando não recebe o seu bem ou serviço, ou ele não é prestado da forma como estava contratado, está protegido. Temos ainda toda a parte de machine learning, inteligência artificial e algoritmos que vamos incorporando e que tornam todas estas soluções mais sofisticadas. Diria que a grande vantagem de uma plataforma tão grande e global como a Visa é que, de alguma forma acabamos por, dado o tão elevado número de transacções que processamos, conseguir ver todos os padrões de comportamentos e incorporar essa informação em modelos neurais de aprendizagem, que vão realimentando estes motores de detecção e prevenção de fraude.
Como viram a entrada das fintech no mercado?
A nossa abordagem tem sido bastante aberta. Há uns anos, abrimos a nossa rede proprietária, pois entendemos que estamos a caminhar para um modelo mais colaborativo. Aliás, temos um programa interno no qual, exactamente através da ligação com as fintech, tentamos encontrar soluções que ajudem a resolver um problema em concreto que um emissor tenha. Criámos ainda um programa para as fintech que queiram entrar na área de emissão, para desta forma terem acesso à rede Visa de uma forma mais simples. É nessa lógica que operamos, estamos a trabalhar cada vez com mais parceiros, incluindo as fintech, para assim incorporar valor na nossa oferta, valor esse que seja possível partilhar com os nossos clientes.