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O novo motor da economia portuguesa é digital

O «’Estudo do Impacto da Economia Digital em Portugal revela uma transformação estrutural que já molda 39% da produção nacional e 23% do emprego. A transversalidade do digital, a urgência do talento e a necessidade de visão económica são agora os pilares de um país que está conectado, mas que precisa de se tornar inteligente.

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Um olhar sobre a produtividade
Essa conclusão ganha maior profundidade quando se observa a análise sobre produtividade. De acordo com o estudo, cerca de 35% do impacto total da digitalização corresponde a aumento puro de capacidade produtiva, isto é, ganhos que não resultam de substituição tecnológica ou de mera automatização, mas de novas possibilidades de produção, inovação e expansão. Este dado, que o estudo descreve como um dos mais relevantes da análise económica, revela que a digitalização não é apenas uma ferramenta de eficiência; é um multiplicador económico.

Filipe Grilo sublinha à businessIT essa mudança conceptual: «O facto de cerca de 35% do impacto da digitalização corresponder a aumento líquido da capacidade produtiva tem uma implicação muito clara para as empresas portuguesas: o digital não serve apenas para cortar custos, é um motor de crescimento real». Esta afirmação é confirmada pelos dados do documento, que mostram aumentos significativos não só no valor acrescentado bruto, mas também no emprego, nas remunerações e na receita fiscal. O estudo detalha que a digitalização permitiu aumentar o VAB em 13%, o emprego em 19%, as remunerações em 13% e a receita fiscal em 18%. Estes valores, apresentados de forma cuidadosa e fundamentada, revelam uma economia que cresce através da tecnologia, mas que precisa de a integrar de forma estratégica para que o impacto se torne sustentável.

Este aumento da capacidade produtiva, porém, coloca desafios tanto às empresas como ao Estado. Para Filipe Grilo, as empresas que olham para o digital como mera obrigação estão a desperdiçar oportunidades. «A digitalização, quando bem integrada no modelo de negócio, permite produzir mais, inovar mais e escalar operações com mais margem – mesmo em sectores tradicionalmente pouco digitais». Mas o coordenador científico lembra que esta transformação deve acontecer também no sector público: «O Estado não pode apenas financiar a transformação digital dos outros, tem de se transformar também». O estudo reforça esta ideia ao explicar que uma administração pública digitalizada, interoperável e orientada para resultados multiplica o impacto da digitalização sobre toda a economia.

Administração pública com boa performance
Nesta análise, a administração pública portuguesa surge com uma classificação surpreendentemente elevada. Lê-se no documento que Portugal tem 84,5 pontos na avaliação dos serviços públicos digitais dirigidos aos cidadãos, acima da média europeia. A maturidade destes serviços – incluindo segurança digital, qualidade da experiência do utilizador e consolidação da comunicação online – coloca o país entre os líderes europeus. Mas o estudo nota que persistem assimetrias na profundidade dos serviços, especialmente quanto ao grau de integração e interoperabilidade entre organismos.

A robustez tecnológica portuguesa – fibra óptica, cobertura de 5G, data centres, serviços digitais avançados – é amplamente documentada. Mas, como lê-se no estudo, «o desafio agora já não é tecnológico, é estratégico». A questão que atravessa várias páginas do documento é clara: Portugal tem a infraestrutura, mas tem a visão económica? Esta interrogação torna-se ainda mais relevante quando se observa outro dos grandes temas do estudo: o talento. A análise mostra que 89% dos portugueses estão online, mas apenas uma minoria domina competências digitais avançadas. O estudo descreve este fenómeno como «o paradoxo do progresso»: rodeados de tecnologia, mas com défice de fluência digital. O impacto desta lacuna é profundo: sem talento qualificado, as empresas não conseguem transformar maturidade tecnológica em valor económico.

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