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«Temos armas poderosas que são o conhecimento, a capacidade de trabalho e a inovação»

Paula Gomes da Costa, Porto Tech Hub

Afasta-se de discursos miserabilistas. Diz que os portugueses são bons porque têm conhecimento, capacidade de trabalhar e competências para a inovação. Mas também admite que há que melhorar a capacidade de organização e a visão empresarial. Paula Gomes da Costa, presidente da Associação Porto Tech Hub, quer pôr o Porto e o Norte como destino das TI.

A Porto Tech Hub nasceu em 2015 em formato de conferência, organizada pela Blip, Farfetch e Critical Software. Porque é que avançaram para a criação de uma associação?

Basicamente, porque a conferência correu demasiado bem para se perder todo o seu potencial. Na altura, foi pro-bono para os participantes, que acabaram por ser oitocentos, um número de que não estávamos mesmo à espera.

Quem é que assumiu os custos dessa primeira conferência?

Foram assumidos pelas três empresas, desde o catering aos speakers, com o apoio da Câmara Municipal do Porto, que nos cedeu o Rivoli. A questão é que, quando percebemos a dimensão do ecossistema criado, sabíamos que era necessário fazer mais alguma coisa. Acreditamos que o Porto e a região Norte são um destino onde se encontram recursos com qualidade na área das tecnologias e onde as empresas podem vir a localizar-se. Porque somos bons. E aquela conversa miserabilista não é, de todo, válida. Somos bons tecnicamente, temos excelentes universidades e queremos ser conhecidos.

E hoje, passados três anos, o que é a Porto Tech Hub?

Os fundadores falaram com outras empresas da região e convidaram-nas a associarem-se ao projecto. Que passa por várias vertentes, para além da conferência. Aliás, a conferência quer ter visibilidade nacional, mas o grande objectivo é projectar este destino internacionalmente, o que já aconteceu este ano. Outra vertente muito importante da Associação é a partilha de conhecimentos e boas-práticas entre as empresas.

E isso é feito como?

Através de uma área que denominamos ‘comunidade’ e pela troca de experiências. Por exemplo, facultamos visitas para que conheçam as nossas tecnologias ou o desenvolvimento que fizemos para suportar o nosso processo produtivo. Outra área onde queremos actuar é a dos recursos. Porque simplesmente não há pessoas e não é possível termos um ecossistema sustentado se começarmos a canibalizar os recursos uns aos outros. Foi dessa tendência de escassez de recursos que surgiu, em parceria com o ISEP, o swITch, um programa de reconversão de recursos.

E em termos de associados?

Houve um processo de crescimento no qual, à Associação, se juntaram empresas como a Sonae Bit, a Euronext, a i2S, a Fabamaq, a ITSector ou a starup Codigree, entre outras. Conseguimos trazer uma série de empresas que partilham das mesmas dores e ideais. O objectivo é continuar a crescer durante 2018.

As startups são uma evolução natural no mundo dos negócios? Há uma “facção” do mercado que acredita haver alguma irresponsabilidade empresarial na criação massiva de startup, porque não têm planos de negócios consistentes, que é uma “moda”…

É uma evolução. Fazem parte de um ecossistema empresarial que permite fazer uma triagem. As pessoas que saem da universidade e criam uma startup, a bem ou a mal, acabam por ganhar experiência em áreas que desconheciam. Quer sejam bem ou mal-sucedidos. Se a startup falha, eles vão continuar a ser recursos disponíveis que tiveram experiência em condições reais de trabalho. E vão ser fundamentais para dar maturidade ao ecossistema empresarial a nível das tecnologias. É pena que não haja mais startups em outros sectores, provavelmente iriam trazer dinamismo a áreas industriais.

Portugal é um mercado manifestamente pequeno. Que armas temos?

Temos de nos fazer valer da criação de valor, da qualidade. Já trabalhei numa empresa indiana que tinha um campus em Bangalore com 65 mil pessoas. Não podemos lutar contra isso. Mas nós, portugueses, temos armas poderosas que são o conhecimento, a capacidade de trabalho e a inovação.

E onde precisamos de evoluir?

Na capacidade de organização. E sim, temos de evoluir nos planos de negócio e na sustentabilidade. Temos de melhorar a visão empresarial.

Como é que os portugueses lidam com a mobilidade dos recursos?

Curiosamente, acho que por portugueses ainda têm alguma aversão à mobilidade. A minha experiência diz-me, por exemplo, que uma pessoa do Porto vai para Lisboa se não tiver hipótese de empregabilidade ou de crescer profissionalmente na zona. Ou seja, não é uma opção, é uma inevitabilidade. Mas acho que esta tendência gradualmente se está a esbater, sobretudo pelo facto de os meios de transporte serem mais, e mais baratos. Além de que o trabalho remoto é cada vez mais usado. Mas na questão dos recursos temos de aproveitar sinergias.

Como assim?

A Porto Tech Hub é pequena. Por isso, já começamos a fazer parcerias com, por exemplo, Santa Maria da Feira. Vamos abordar São João da Madeira, que tem um parque de tecnologia, Braga, a UTAD… ou seja, se conseguirmos reunir parceiros e alargar o âmbito de actuação, dá-nos uma escala muito maior.

Mas o problema é captar talentos?

São escassos, sim. De Coimbra para cima são pouco mais de quinhentas as pessoas que saem dos cursos de engenharia ou relacionados com tecnologia de informação. Com o programa swITch, por exemplo, o que fizemos foi pegar em alunos que vinham da área de ciências, tecnologias, engenharias, matemáticas e afins e fizemos uma triagem. De trezentas candidaturas, organizamos uma turma de 29 pessoas, a quem vamos dar conhecimento para compreensão e aplicação de desenvolvimento de tecnologias Orientadas a Objectos (Java) ou Web.

O curso tem custos?

Tem e foi propositado. É necessário ser considerado um investimento pessoal. A contrapartida é a de que, no fim do curso, há a oportunidade de fazer um estágio remunerado numa das empresas da Associação.

Podem, então, reaver o investimento?

Exacto, além de que conseguimos linhas de crédito com os bancos BPI e Santander em que os valores só começam a ser pagos quando o estágio começa. Basicamente, o que queremos é um compromisso.

Foi a primeira presidente e como os mandatos são de três anos, estará agora de saída…

Sim, vai haver uma Assembleia Geral. É bom que haja sangue novo, com novas ideias.